Calamidade pública é cheque em branco para prefeitos e aumenta risco de desvios
Mais de 20 cidades baianas tiveram a calamidade pública reconhecida pela Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA) nesta quarta-feira (1º), mesmo que algumas delas não tenham um único caso confirmado do novo coronavírus. A discussão sobre a aprovação desses pedidos levantou polêmica entre os deputados. Em um primeiro momento, houve resistência em antecipar o aval da Assembleia para cidades sem casos de Covid-19. Para além disso, a preocupação deveria ser outra: o risco dessa espécie de “cheque em branco” lesar cofres públicos em municípios já cambaleantes.
Por que “cheque em branco”? Com o estado de calamidade reconhecido, gestores deixam de ter a obrigação de cumprir a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). A autorização veio do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, que entendeu que a pandemia permitiria essa flexibilização. O desafio é manter a tranquilidade quando é sabido que muitos políticos não possuem interesses republicanos quando se trata de dilapidar os cofres públicos – e a própria história é repleta de exemplos.
Durante a sessão do Legislativo estadual, essa tensão apareceu de maneira tangencial. No entendimento de alguns deputados, caberia ao Tribunal de Contas dos Municípios (TCM) averiguar a execução do orçamento durante a crise. Não está completamente errado. Porém, em meio a um cenário de guerra como o esperado, é improvável que os técnicos do órgão auxiliar da Assembleia deem conta de fiscalizar minuciosamente. Por isso o papel do cidadão será fundamental nesse processo. E o da imprensa também.
Nos municípios maiores, como Salvador, Feira de Santana e Lauro de Freitas, por exemplo, a chance de gastos indevidos passarem despercebidos é menor. Há uma vigilância maior, além de uma oposição mais consistente nas câmaras de vereadores. O mesmo não acontece nos pequenos municípios, que se apressaram em garantir a calamidade, mesmo que a situação esteja apenas em emergência. Não é que não esteja reconhecendo a gravidade da situação. Apenas apresento uma pulga atrás da orelha nessa “porteira aberta” confirmada pelos deputados estaduais, ainda que a contragosto de alguns.
Lembremo-nos que 2020 ainda é ano de eleição para prefeitos e vereadores e que a campanha pode não ter recursos para financiamento, diante da perspectiva real do uso do fundo eleitoral para o combate à Covid-19. Então, a atenção tem que ficar redobrada, para evitar que o uso indiscriminado dos recursos, com base nesse “cheque em branco”, seja muito mais eleitoreiro do que humanitário.
Fonte:Bahia Notícias / Fernando Duarte