Empresas afirmam que sindicatos cobram até R$ 500 para fechar acordo trabalhista
Empresas que aderiram ao programa do governo federal que permite redução de salário e jornada e suspensão de contratos relatam ter recebido cobranças de até R$ 240 por funcionário para que os sindicatos de trabalhadores dessem o aval aos acordos.
A prática, segundo especialistas, é ilegal. Associações patronais falam também em cobranças de R$ 500 por empresa e de percentuais da folha de pagamento entre 4% e 8%.
A Medida Provisória 936 de 1º de abril permitiu acordos individuais para reduzir salários e jornada e também para supender os contratos de trabalho.
Para Paulo Solmucci, presidente da Abrasel, uma das entidades a acusar a cobrança, a decisão do ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), que em liminar na semana passada definiu que os acordos individuais terão validade somente após manifestação do sindicato dos trabalhadores, estimulou a exigência por parte dos sindicatos.
“Ninguém tem dinheiro nem para pagar salário, não fazem nem sentido”, diz.
Na segunda (13), em nova decisão, Lewandowski diz que as negociações individuais de empresas têm efeito imediato, independentemente de posterior manifestação sindical.
As seis centrais sindicais orientaram os sindicatos associados a não fazer qualquer cobrança no momento. Em nota conjunta, CUT (Central Única dos Trabalhadores), Força Sindicial, CSB (Confederação dos Sindicatos do Brasil), UGT (União Geral dos Trabalhadores), CTB (Confederação dos Trabalhadores do Brasil) e NCST (Nova Central) disseram considerar a cobrança criminosa e que sindicatos serão denunciados ao MPT (Ministério Público do Trabalho) caso insistam na prática.
Além da Abrasel, Alshop (associação dos lojistas de shoppings) também divulgou nota relatando a existência desse tipo de cobrança. Não informou, no entanto, quais sindicatos exigiram pagamento para liberar os acordos.
Em Santa Catarina, o sindicato que representa os funcionários de hotéis, restaurantes, bares e na rede de hospedagem de Florianópolis e dos municípios do entorno, o Sitratuh, decidiu incluir uma cobrança chama taxa negocial.
O advogado Fernando Fávere, assessor jurídico da entidade, defende a cobrança, que varia de R$ 20 a R$ 100 por acordo; o valor muda de acordo com o tamanho da empresa.
“Nós temos que analisar acordo por acordo, não é simplesmente carimbar papel. Já liberamos 400 e ainda temos 300, então todo mundo está fazendo horas extras. É uma operação que tem um custo para o sindicato”, afirma.
Para o professor de direito trabalhista da FMU (Faculdades Metropolitanas Unidas) Ricardo Calcini, a cobrança é ilegal. Ele afirma que os sindicatos têm o direito de buscar novas receitas, mas não deveriam cobrar por serviços que são próprios às suas funções. “Além de ilegal, me parece que acaba criando um estímulo à rescisão do contrato”, diz.
A medida provisória definiu que as empresas poderão fazer reduções de jornada e salário em 25%, 50% e 70% por um período de até três meses. Para os funcionários que ganham entre R$ 3.135 e R$ 12.202, esses acordos poderão ser feitos de maneira individual e os sindicatos serão comunicados em até dez dias. Para quem ganha mais de R$ 3.135 e menos do que R$ 12.202, somente a redução de 25% dispensa negociação coletiva.
Solmucci, da Abrasel, diz que, em levantamento realizado na semana passada, a associação identificou a exigência cobranças de até R$ 680 por funcionário em caso de suspensão de contrato, mas que depois de as empresas denuciarem a prática, muitos sindicatos recuaram.
A advogada Priscila Arraes Reino diz que, ainda que algum tipo de taxa negocial seja prevista em convenção coletiva, a cobrança não deveria ser aplicada no momento. “É uma situação muito peculiar e você acaba criando um empecilho às negociações”, afirma.
Para ela, cobrar um valor fixo ou um percentual sobre a folha de pagamento não estão previstos em lei.
Em São Paulo, os sindicatos dos comerciários, dos metalúrgicos e dos trabalhadores de bares e restaurantes informaram que todos os acordos estão sendo analisados e liberados em qualquer tipo de cobrança.
A advogada Caroline Marchi, do Machado Meyer, afirma que não há, na legislação, nada que proíba, de fato, essa cobrança às empresas, mas que a prática é desaconselhada pela OIT (Organização Internacional do Trabalho). Se houvesse uma cobrança, ela não poderia ser aplicada aos funcionários, pois o interesse, nos caso desses acordos, é indireto.Folha de S.Paulo