Decisão do STF sobre porte de maconha demanda novos procedimentos
Os peritos criminais brasileiros estão aguardando novas orientações para o exame de pequenas quantidades de maconha apreendidas pela polícia. Essa expectativa surge após o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir que a posse de até 40 gramas de cannabis sativa ou seis plantas-fêmeas, produtoras de flores ricas em THC, não é crime. A informação foi divulgada pela Agência Brasil.
O presidente da Associação Brasileira de Criminalística, Marcos Secco, perito criminal do Mato Grosso, acredita que novos procedimentos devem ser estabelecidos para definir claramente a situação gerada pela decisão do STF.
O STF, ao julgar um recurso extraordinário sobre a posse de pequenas quantidades de maconha, determinou que, se uma pessoa for flagrada usando a droga, a maconha será confiscada e o usuário levado à delegacia. O delegado não deve ordenar a prisão em flagrante ou instaurar inquérito, mas sim registrar a ocorrência como infração administrativa e liberar a pessoa, notificando-a para comparecer em juízo para ser ouvida e possivelmente receber uma sanção não penal.
A droga apreendida será examinada em laboratório por peritos, que identificarão a substância e mensurarão o volume. Marcos Secco destaca a falta de definições sobre a obrigatoriedade de pesagem da droga em balanças certificadas e a necessidade de preparar laboratórios e técnicos para essa nova rotina. Se plantas forem confiscadas, o serviço de botânica nos institutos de criminalística precisará ser ampliado.
Quem for apanhado com pequenas quantidades de maconha poderá ser advertido sobre os efeitos da droga ou obrigado a frequentar cursos educativos. No entanto, o defensor público Bruno Shimizu, presidente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), aponta que a Lei das Drogas (Lei nº 11.343/2006) não prevê um procedimento específico para a apuração de infração administrativa. O STF decidiu que, até que haja regulamentação, essas sanções continuarão a ser impostas judicialmente, enquanto o Congresso Nacional não legislar sobre o assunto.
Além disso, o STF determinou que o governo deve criar programas educativos sobre os riscos do uso de drogas e fornecer tratamento para dependentes, envolvendo diversos órgãos do Estado. A Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos (Senad), do Ministério da Justiça e Segurança Pública, coordenará grande parte dessas políticas públicas.
Lívia Casseres, advogada e coordenadora-geral de projetos especiais sobre drogas e justiça racial da Senad, acredita que a decisão do STF pode reduzir o estigma sobre os usuários de drogas e permitir que essas pessoas sejam alcançadas por políticas preventivas de promoção da saúde e cuidado. Ela destaca que muitas questões técnicas ainda precisam ser discutidas e amadurecidas a partir da compreensão do acórdão completo do STF, que deve ser enviado em agosto após o recesso judiciário. Até agora, a Senad e outros órgãos receberam apenas a ata com o resumo dos debates e a resolução.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), liderado pelo presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, também aguarda o acórdão para implementar novas políticas judiciárias, como mutirões carcerários para revisar as prisões de pessoas flagradas com menos de 40 gramas de maconha.
Há, contudo, divergências sobre os efeitos da decisão do STF. O advogado Cristiano Maronna, diretor do Justa, teme que o impacto seja pequeno e que a resolução apenas mude superficialmente a situação. Ele critica a presunção de tráfico baseada apenas no testemunho policial e na quantidade de droga apreendida.
Por outro lado, Gabriel de Carvalho Sampaio, diretor de litigância e incidência da ONG Conectas Direitos, acredita que a decisão do STF é significativa e reconhece as injustiças cometidas pelo Judiciário e pela polícia na aplicação da lei de drogas. Ele destaca que a resolução do STF impede que a simples apreensão de maconha e o testemunho policial sejam suficientes para enquadrar alguém como traficante, oferecendo uma proteção importante aos usuários.